Demissexualidade causa divergências de opiniões no CAHL

Orientação sexual ganhou espaço nas redes sociais após famosos declararem identificação

Tarcísio Cearense

*Publicação de dezembro de 2022
Demissexualidade está em alta. Ilustração. Fotografia: iStock

A demissexualidade parece estar parece estar em alta entre famosos e recentemente ganhou espaço nas redes sociais. A cantora Iza, por exemplo, foi uma das que estimulou a discussão sobre o assunto em uma participação no Podcast Quem Pod, Pod, no dia último dia 18 de outubro, o que gerou grande repercussão na internet. Outra que também declarou fazer parte da comunidade foi a atriz Giovanna Ewbank, a apresentadora do podcast que tratou do tema em parceria com Fernanda Paes Leme. No Centro de Artes, Humanidades e Letras (CAHL), da UFRB, em Cachoeira, o posicionamento sobre a sexualidade divide opiniões.

A cantora Iza falou sobre o termo quando começou a falar sobre o seu recente término do casamento com o produtor Sérgio Santos. O assunto rendeu vertentes sobre a vida sexual e sobre a famosa ‘primeira vez’. Ela abordou suas inseguranças e revelou sua orientação sexual.

A cantora Iza falou sobre o assunto ao abordar o fim de seu casamento com o produtor Sérgio Santos. Foto: Reprodução (Youtube)

“Transei com pouquíssimas pessoas. [Acho que sou demissexual, porque] demora muito para eu querer transar com a pessoa, se eu não tiver nenhuma relação. Eu transei uma vez e foi tranquilo, deu tudo certo, mas fiquei me questionando. Demorei para entender que tinha a ver com isso. Preciso admirar muito para falar: ‘Quero te dar’, disse Iza durante a entrevista.

Já a atriz Giovanna Ewbank, que é a apresentadora do podcast onde o assunto foi levantado em parceria com Fernanda Paes Leme, relatou sua trajetória sexual durante a mesma entrevista com Iza e também expôs que compartilhava do mesmo referencial.

“Tem que ter sentimento para transar com a pessoa. Meu sonho era sair transando, curtindo e… Aqui e ali e nossa! Foi ruim, foi bom. Não tenho muitas referências”, disse Giovanna Ewbank.

A atriz Giovanna Ewbank valoriza o sentimento para ter relações com uma pessoa. Foto: Reprodução (Youtube)

Assim como as artistas, muitas pessoas se sentem mais reservadas ou privadas no início de um relacionamento, preferindo então manter as coisas com um pouco mais de calma e até com mais cautela, preferindo priorizar o sentimento do que as “relações líquidas”, ou seja, experiências pessoais de cada um, sem a construção da identidade de um casal, da integração entre dois indivíduos: estes são os demissexuais. O conceito de liquidez foi cunhado pelo sociológo e filósofo polonês Zygmunt Bauman cunhou o termo “liquidez” e um de seus livros foi intitulado “Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos (2003).

Existem casais/parceiros que conseguem sair e no primeiro encontro se relacionam sexualmente de forma muito natural, sem que isso não se torne um peso na consciência ou algo que foi feito à força como uma violação ao corpo, ou podem se sentir usadas e manipuladas.

Bandeira que identifica a comunidade Demissexual. Foto: Wikipedia

Segundo o site e revista Veja na publicação da reportagem “Nada de sexo casual: as demissexuais apostam na afinidade emocional” (2022), a definição do termo se dá por pessoas que afirmam que apenas sentem atração por pessoas com quem já desenvolveram algum laço afetivo, o que requer tempo e intimidade. Muitos desses indivíduos ao se identificarem com a orientação, não são muito bem vistos ou acolhidos no momento de conhecer alguém ou tentar iniciar uma relação, o que pode ser um problema para o outro parceiro. No ambiente acadêmico, mais precisamente na UFRB, muitos estudantes não sentem o assunto tão contemplado para esclarecimento do termo, o que pode gerar ignorância do assunto ou invalidação da causa.

“Descobri minha sexualidade no meu primeiro ano de faculdade no CAHL, em 2019. A minha reação foi “um choque” porque isso era extremamente o que eu sentia e eu demorei muito tempo para descobrir como eu era, sem uma definição. Nunca me senti confortável com o assunto de sexualidade, mas mesmo agora que eu me identifiquei, as vezes acho que eu sou o errado ou sou um problema. É tudo muito complexo, e querendo ou não, as pessoas julgam (mesmo no meio acadêmico) e acabam deixando certas situações desconfortáveis. No passado, já namorei mesmo não gostando ou tendo atração somente para ver se durante o período eu me atrairia pela pessoa, não aconteceu e eu terminei um tempo depoi.”, relatou o aluno Léo Nascimento (22), que faz a graduação em Cinema e Audiovisual e reside em Cachoeira, na Bahia.

Léo Nascimento faz a graduação em Cinema e Audiovisual se identificou a demissexualidade .Foto: Reprodução (Instagram/ @leomanjos)

O graduando em Publicidade e Propaganda Wendel Gabriel (18), da cidade de Feira de Santana também descreveu a sua experiência sobre o acolhimento e discussão da demissexualidade no CAHL:

 “Na universidade, nunca vi ninguém comentando em tom tão auxiliador assim, mas conheço um amigo que também funciona dessa forma. Embora eu converse com muita gente, nunca conversamos sobre tal. As pessoas deveriam ter conhecimento sobre si mesmas e sobre seus sentimentos na universidade. Respeitar a si mesmo é muito importante e pode começar a partir de tal pensamento.”

O acolhimento e discussão da demissexualidade no CAHL agradou o graduando em Publicidade e Propaganda Wendel Gabriel. Foto: Reprodução (Instagram/ @parnasianox)

É possível perceber que a falta de abordagem sobre o assunto e a ausência de uma rede de apoio dentro da Universidade gera uma dor coletiva, como relatou a estudante Heloysa Rodrigues (18) do curso de Artes Visuais e reside em Cachoeira, Bahia.

“Eu descobri que era demissexual quando estava conversando com uma amiga e comentei sobre o fato de já ter namorado mas não sentia vontade nenhuma de fazer sexo. Sinto que ninguém fala sobre o assunto no campus, o que não gera acolhimento para nós. Já me invalidaram pelo fato de que eu beijo pessoas, dizendo que demissexual não pode fazer isso, ou que eu uso a sexualidade como desculpa pra não transar com alguém, além de já ter ouvido na própria universidade (CAHL) que outras sexualidades além dos identificados como gay, bi e lésbica fossem invenção de moda, disse a estudante Heloysa Rodrigues.

Heloysa Rodrigues, do curso de Artes Visuais, acredita que o assunto precisa ser mais debatido. Foto: Reprodução (Instagram/ @helorodriguezz)

‘‘A questão não é que os jovens devem achar que pertencem a um grupo e que por isso eles podem lutar e ter mais visibilidade. A sociedade se dispersa muito em modismos e estereótipos e acabam esquecendo de resolver o verdadeiro mal. Deve-se saber que antes de ter uma relação sexual, é preciso se amar! A partir do processo do momento em que o jovem se conhece, aí sim ele deve vivenciar sua sexualidade e o ato sexual. Muitos jovens acabam tão perdidos que buscam no sexo apagar seus problemas e cura para seus fantasmas existenciais”, avaliou a sexóloga Glícia Neves (45) de Palmas – TO,  que trabalha o desenvolvimento sexual e afetivo a respeito da crescente da comunidade demissexual entre os jovens.

A sociedade acaba camuflando o verdadeiro problema, que parte de onde surgiu o ensinamento e educação desses indivíduos. Não acho que deveríamos separar esses grupos, pois somos todos juntos em um único objetivo. Se esse problema é de um, ele também é meu! Sendo assim, após se conhecerem e se entenderem, a vida sexual deve ser iniciada com respeito, dignidade e amor, não importando a orientação sexual”, completou a sexóloga.

A sexóloga Glícia Neves trabalha o desenvolvimento sexual e afetivo a respeito da crescente da comunidade demissexual entre os jovens.Foto: Reprodução (Instagram/ @glicianeves)

A falta de apoio e de discussão do tema na Universidade pode ser um tabu para muitos ou até gerar uma rede de repressão e preconceito dentro do campus. Incluir o tema na roda de conversas entre os universitários e abrir espaço para que essas pessoas se expressem e relatem seus sentimentos e como apoiar da forma correta.