Documentário revive a história de Vivaldo Bittencourt em Conceição da Feira

Produção financiada por Lei Paulo Gustavo destaca a trajetória do poeta, compositor e dramaturgo que marcou a cultura da cidade foi lançada em novembro

Adrielle Almeida

A história do poeta, compositor e dramaturgo Vivaldo Bittencourt Mascarenhas, figura central na cultura da cidade de Conceição da Feira, localizada a 123,4 km de Salvador, foi contada e produzida por uma agência de conteúdos digitais, Alcance, em um documentário lançado em novembro ao público nas redes sociais do perfil Meu tesouro. Eles tiveram o projeto aprovado pela Lei Paulo Gustavo este ano, com o auxílio de R$ 10 mil.

Vivaldo Bittencourt. Foto reproduzida do livro Meu Tesouro

Produzido e roteirizado por Juva Santos, diretor de Comunicação do município, e apresentado por Naiara Câmara, contadora e entusiasta do projeto, ambos integrantes da agência. A ideia inicial veio em 2014, quando Juva conheceu a história de Vivaldo e decidiu produzir um filme, sem verba suficiente, esqueceu o projeto.

“Decidi em 2014 reviver a história de Vivaldo, ele foi uma figura muito importante para a cidade, merecia esse reconhecimento. Mas produzir um filme gera muito custo, não tinha essa verba e nem o apoio dos grandes empresários daqui”, afirmou o produtor. 

Com a sanção da Lei Paulo Gustavo 2024, Juva viu a oportunidade de executar esse projeto. “Quando o governo lançou a Lei, decidi que era o momento de produzir o filme, mas sem a verba suficiente troquei para o mini doc. Não era o que queria inicialmente, mas já contava, o mais importante era trazer à tona a memória de Vivaldo para as pessoas da cidade. Escrevi o projeto, chamei Naiara que é uma entusiasta dele também, e produzimos”, afirmou.

Com o lançamento do documentário nas redes sociais, Juva afirma que vai produzir algo maior, mais significativo sobre a figura. “Não vou parar só aí, o documentário ficou ótimo, mas quero mais, um acervo, exposição, coisas que realmente mantenha viva a memória de Vivaldo, ainda mais depois que tive o retorno das pessoas, a maioria nem conhecia a história dele.”

Com uma população pequena, sã0 20,8 mil habitantes segundo o Censo Demográfico de 2022 do IBGE, grande parte dos cidadãos da cidade não tinham conhecimento sobre quem era Vivaldo Bittencourt. Assim quem assistiu o documentário se mostrou contente ao ver a história de uma das figuras importantes da cidade revividas.

“Vivaldo foi muito importante para a cultura do município, e ver, conhecer mais a história dele é muito importante para as próximas gerações”, afirmou a professora de Língua Portuguesa do município, Andreza Sena.

Memória

Para o filho adotivo de Vivaldo, Wanderley Mascarenhas, jornalista da cidade, os jovens não estão interessados em conhecer a história do pai. Mesmo sabendo que eles conhecem quem era Vivaldo. Para ele, a iniciativa da agência em reviver a memória do pai foi muito importante. 

“Vivaldo merecia essa homenagem que ganhou com a produção do documentário. Ele era um homem muito simples, que andava e cuidava de todo mundo do município. As pessoas que conheciam ele não estão mais vivos, mas todo mundo que sabe quem e ele, sabe a importância da vida dele”, destacou Wanderley.

Natural de Conceição da Feira, Vivaldo nasceu em 31 de dezembro de 1900 e viveu quase toda sua vida no município, onde morreu em 28 de março de 1976. Reconhecido por sua dedicação ao próximo, ele cuidava dos doentes em uma época em que a cidade não contava com médicos, aplicando injeções e atendendo a todos, ricos e pobres, sem distinção. Em situações mais delicadas, era ele quem preparava os mortos para o sepultamento.

“Ele era enfermeiro da cidade, qualquer coisa era com ele. Por trabalhar em várias farmácias, as pessoas procuravam ele para tirar as dúvidas, até para arrumar o morto no dia do sepultamento. Ai como ele gostava de tomar uma birita, quando chegava alguém para pedir alguma receita, alguma coisa, ele dizia, ‘morreu o enterro é amanhã as 16 horas, vigi nossa senhora’, mas depois saia para atender”, disse o filho Wanderley.

Autor do hino oficial da cidade, apesar de ter sofrido adaptações ao longo dos anos, a essência da obra permanece, especialmente nos versos “Ô Salve! Ô Salve! Conceição!“, que continuam ecoando nas vozes dos moradores. Todos os anos, esses versos e estrofes são escoados pelas vozes dos filhos da terra, e o legado e admiração pelo poeta musical fica vivo.

Além do hino, Vivaldo compôs muitos poemas e músicas que foram sucesso na época e que até hoje representam um patrimônio cultural. Ele registrava suas criações em um antigo livro caixa, que agora compõe Meu Tesouro. Uma obra artesanal cheia de recortes, fotos e anotações, escritas por ele.

O livro, considerado um tesouro literário pelos familiares, ficou muito tempo compartilhado apenas com os parentes e amigos próximos, porém, agora está ao alcance de todos os moradores da cidade. De forma digital, disponibilizada pelos familiares. Nele, Vivaldo eternizou não só relatos pessoais, mas valores da cultura de Conceição da Feira. 

     Capa original do livro “Meu Tesouro”. Fonte: livro “Meu Tesouro”

 Apresentação original do livro “Meu Tesouro”. Fonte: livro “Meu Tesouro”

Em “Meu Tesouro”, Vivaldo leva a um passeio por suas vivências e pelo Brasil da época dos anos de 1967, que estava vivendo os primeiros anos da ditadura militar. Ele comentava temas do cotidiano e fazia críticas bem-humoradas a questões sociais e culturais, como as crises econômicas, os costumes da época e as festividades populares. O poeta criava ainda, peças teatrais, gritos de carnaval, tudo registrado no seu livro.

               Divulgação da peça teatral criada por Vivaldo. Fonte: livro “Meu Tesouro”

Uma curiosidade fascinante sobre Vivaldo é que ele escrevia muitas de suas obras em uma gruta misteriosa na Serra da Putuma. Local tradicional de reza e turismo da cidade, que serviu de inspiração para algumas de suas maiores criações. Mas, curiosamente, até o momento desta reportagem, essa gruta não foi encontrada.

Homem de fé, sua vocação era na Igreja Católica, colaborando em eventos religiosos, como a tradicional procissão de Nossa Senhora da Conceição, padroeira da cidade, realizada todo dia 8 de dezembro. Ele era responsável pela decoração da Charola da Santa, tarefa que fazia com zelo e criatividade, como está registrado no seu livro “Meu Tesouro”.

Além disso, esteve à frente das celebrações do Terno de Reis, cuidando dos cânticos, fantasias e alegorias. Seu envolvimento com a cultura ia além do religioso. Vivaldo organizava bailes de Carnaval e festas juninas, sempre com ajuda dos amigos. Registros presentes no documentário, que resgatou a memória de Vivaldo. Com o lançamento do documentário, a trajetória de Vivaldo Bittencourt é redescoberta e celebrada.

         Últimos registro de Vivaldo. Fonte: livro “Meu Tesouro”

Confira o primeiro episódio do documentário: