Entre metrô e BRT usuários enfrentam engarrafamentos em Salvador

A capital da Bahia sofre com inúmeros problemas de mobilidade urbana. Entenda como as obras mudanças em vias tem afetados os usuários do transporte público

Giovanni Aguiar

Os engarrafamentos são diários na região que deveria ser a mais tranquila após o BRT. Foto: Giovanni Aguiar

A rotina dentro de uma grande capital brasileira sempre é frenética. Enfrentar longas horas dentro do transporte público ou privado, engarrafamentos, obras e cansaço até a chegada em seus destinos são situações comuns, principalmente em Salvador. Mobilidade urbana é uma das principais áreas de cuidado do governo municipal, mas atualmente é difícil entender quem é que está sendo realmente beneficiado com as obras na capital baiana.

Segundo o site da  empresa CCR metrô, detentora dos direitos sobre as linhas de metrô em Salvador, atualmente circulam 400 mil pessoas por dia nas 22 estações que estão divididas em duas linhas. Por mais positivos que esse números possam ser, já que são aproximadamente 16% da população de 2,4 milhões de acordo com o último Censo Demográfico de 2022, na prática há dificuldade por parte dos soteropolitanos para o deslocamento dos bairros até as estações de metrô.

Linhas do metrô de Salvador

Essa problemática sobre os deslocamentos entre os modais se tornou ainda maior depois do fim de mais de 100 linhas de ônibus nos últimos quatro anos. De acordo com dados do movimento “devolva meu busu”, entre 2013 e 2024 ocorreu uma queda de 32% da frota, passando de 2,5 mil para aproximadamente 1,7 mil veículos. Grande parte da linha de ônibus que foram extintas eram as que garantiam a mobilidade de moradores de bairros mais periféricos para o centro comercial da cidade. 

Em entrevista a Aratu On, em julho e 2024, o doutor em Arquitetura e Urbanismo e pesquisador pelo Instituto Federal da Bahia (IFBA), Pablo Florentino, garantiu que os cortes nas linhas de ônibus foram errôneos e equivocados, já que a prioridade deveria ser a manutenção das linhas que alimentam o metrô.

 Essa é a mesma visão de Pablo Nascimento, motorista por aplicativo que recentemente precisou usar o transporte público para se deslocar pela cidade.

“Fiz o teste de usar justamente o BRT, porém o BRT na faixa BRT gira rápido, a demora não é tanto, mas aí o que acontece? Não temos a locomoção dos bairros para o BRT ou dos bairros para o metrô, até chegar o metrô a gente passa um sufoco dentro dos bairros”, reclamou o motorista.

Apesar disso, o BRT é uma tentativa do estado em melhorar a mobilidade dentro da cidade. Esse sistema de transporte é basicamente uma linha exclusiva para o ônibus, mas com algumas diferenças que estão desde a maior capacidade de pessoas por veículo até o valor para implementação que é mais em conta que um metrô, por exemplo. Esse “novo” meio de transporte da capital já tem dois anos da sua inauguração, mas ainda conta com obras para a conclusão de suas linhas. 

Atualmente, de acordo com informações descritas no site da prefeitura, o sistema tem o planejamento para possuir quatro trechos na cidade, chamados de B1, B2, B3 e B4, respectivamente. O primeiro, e talvez mais importante trecho, é chamado de Estação Rodoviária/Pituba tem 3km de extensão, quatro estações (Rodoviária, Hiper, Cidadela e Parque da Cidade) e busca facilitar o deslocamento em uma das áreas mais movimentadas de Salvador, que é a frente do Shopping da Bahia e do terminal rodoviário de cidade. 

Linhas do BRT

Segundo o site do governo do estado, o BRT é utilizado por 1,5 milhão de pessoas mensalmente. Segundo o site da prefeitura do estado, a meta, após conclusão de todas as estações, que estão acontecendo gradualmente,  é chegar a 3 milhões usuários. Ainda assim, a chegada desse novo meio de transporte público, principalmente em seu primeiro trecho, não tem agradado. Pablo Nascimento também se pronunciou sobre essa situação.

“Com a chegada do BRT, pra nós motoristas que estamos todos os dias aí subindo e descendo na cidade, tínhamos a imaginação de que o trânsito ali na região Iguatemi, Caminho das Árvores, ia ficar fluido, né? Ia fluir mais rápido. Porém, no meu campo de visão, o que eu vejo é que não mudou nada, na verdade“, afirmou o motorista.

Essa reclamação é comum por parte dos usuários mais assíduos dos transportes públicos da cidade. Joice Costa, 24, advogada recém-formada, mora em Pau da Lima e trabalha em um centro empresarial nas proximidades do Shopping da Bahia e afirma que por mais que exista o metrô, seus deslocamentos para o trabalho sempre são muito ruins devido ao engarrafamento nas proximidades de seu trabalho.

 “É sempre muito ruim chegar e sair. Tá sempre muito engarrafado e já me atrasei algumas vezes por isso. Sem falar nas opções, antes do corte da linha eu tinha mais opções de ônibus para ir e voltar. Agora preciso ir de metrô muito cheio ou esperar muito tempo por só um ônibus, quem também vem cheio, para ir para casa”, disse Joice Costa.

Além de Joice, sua irmã, Elisa Costa, cursa engenharia mecânica no campus da UniJorge situado na Paralela e depende dos deslocamentos por meio de transporte público para se locomover pela cidade, principalmente para faculdade. Sobre o fim de algumas linhas ouça o áudio:

Para além dos problemas de deslocamento causados pelas obras que deveriam trazer  melhorias à mobilidade urbana de Salvador, toda essa situação já tem sido problematizada logo após o início prático das intervenções. Em matéria do G1, publicada em 2018, as obras do governo do Estado para a construção das linhas do BRT já causariam uma série de problemáticas como desmatamento e vias exclusivas para carros. O que na prática não beneficiaria realmente os usuários dos transportes públicos.

Em entrevista ao site Farol da Bahia em matéria publicada em 22 de outubro, o professor do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e coordenador do Meio Ambiente da Superintendência de Meio Ambiente e Infraestrutura (Sumai-UFBA), Antonio Lobo, afirmou que as constantes obras sem Salvador tem diminuído ainda mais as áreas verdes da capital e que as estratégias adotadas pela prefeitura como plantio de mudas, não têm sido suficientes para repor os desmatamentos.

Segundo pesquisa feita pela rede MapBiomas e disponibilizada em matéria do jornal A Tarde Online, em novembro, Salvador conta com aproximadamente 26% de área verde em seu território, sendo a segunda em todo o país. Ainda assim, a capital sofre com uma verticalização de suas áreas urbanas, onde praças e áreas verdes têm sido substituídas por prédios e cada vez mais cimento, o que tem se refletido diretamente em um esvaziamento da cidade. 

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em seu último censo demográfico, apontou para um êxodo urbano de quase 260 mil pessoas da capital baiana. Esse além do valor ser o maior do Brasil, esse fato demonstra que Salvador tem perdido sua população para cidades do interior, que possuem uma rotina menos frenética e que permite uma qualidade de vida maior. A maior parte desse êxodo, se deu pós-pandemia, onde as pessoas por ficarem muito tempo em isolamento em suas casas, começaram a valorizar mais as interações e tempo de qualidade. 

Além desses fatores, os problemas de deslocamento por Salvador são também fundamentais para essa grande migração da capital. Em entrevista para a matéria do G1, a advogada Louise Mascarenhas, saiu de Salvador e foi para Santo Antônio de Jesus para buscar uma maior qualidade de vida. Nessa mudança, ela afirma que agora que as distâncias são mais curtas ela consegue voltar para casa no horário de almoço e fazer a refeição com a família.

A situação da mobilidade urbana é um tópico muito grande e com inúmeras minúcias, o que torna esse tema muito abrangente e influente em muitas áreas. Por mais que as mudanças que o governo tem feito seja com o intuito de melhorar o deslocamento dentro de áreas específicas da cidade e beneficiar o usuário de transporte público, fica claro que a opinião pública tem mostrado uma outra face dessa situação, que parece estar muito longe do fim.