Hospital Dom Pedro de Alcântara é referência para tratamento de pacientes do Portal do Sertão e territórios vizinhos
Por João Pedro Miranda
Fachada do HDPA (créditos: Santa Casa de Misericórdia)
O Hospital Dom Pedro de Alcântara (HDPA) é uma instituição de saúde administrada pela Santa Casa de Misericórdia em Feira de Santana que está em funcionamento há 165 anos. Mantido principalmente com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS), mas também por capital privado de fonte filantrópica, o hospital é a única unidade de referência em cardiologia e oncologia para os 72 municípios da Macrorregião Centro-Leste do Estado da Bahia. Essas características põem o hospital em uma situação de importância social em relação às demais unidades de saúde de Feira de Santana. A instituição concentra um grande número de histórias de vida que ajudam a elucidar a importância social do Dom Pedro e do projeto de saúde pública que valoriza o SUS e a contribuição direta da sociedade civil.
O HDPA é mantido pela Santa Casa de Misericórdia, organização de direito privado fundada em Feira de Santana em 1859 durante a visita do imperador Dom Pedro II. Graças a uma doação de 2 contos de réis (aproximadamente R$ 246 mil em valores atuais) do monarca a criação da instituição foi viabilizada, gesto que rendeu ao monarca a homenagem no nome do hospital. Curiosamente, Pedro de Alcântara não seria o último chefe de estado brasileiro a marcar a história da Santa Casa em Feira de Santana. A unidade de saúde também contou com outra visita ilustre em seus corredores, a passagem de Juscelino Kubitschek pela cidade em 1957.
Corredor do HDPA; ao fundo quadro de Dom Pedro de Alcântara (créditos: Santa Casa de Misericórdia)
Feira de Santana e o HDPA continuam sendo o ponto de encontro não apenas de pessoas em necessidade, mas de profissionais das mais diversas áreas e municípios vizinhos que buscam uma oportunidade para a construção de suas carreiras.
É o caso do jornalista, Ediéric Magalhães dos Santos, que trabalha há cinco meses como assistente de comunicação da Santa Casa de Feira, mesmo morando em São Gonçalo dos Campos. “É um pouco difícil, principalmente por causa da instabilidade em relação ao deslocamento. Tem os transportes que fazem esse translado intermunicipal, eu venho de van e depois tem o deslocamento a pé”, contou. Quando perguntado se sempre quis trabalhar na área da saúde, o profissional respondeu que nunca havia cogitado. “Inclusive, na faculdade, a assessoria não era uma área que me interessava bastante. Tenho descoberto novas possibilidades”, ponderou.
Feira de Santana está inserida no território de identidade do Portal do Sertão. A cidade destaca-se em relação aos demais municípios do território por conta do maior fluxo de atividades econômicas, em especial, nos setores de serviços, comércio, agropecuária e indústrias, somando um Produto Interno Bruto (PIB) per capta de R$ 25,54 mil, de acordo com dados da Superintendência dos Estudos Econômicos e Sociais (SEI) da Bahia de 2021. O desenvolvimento econômico do município é causador de um efeito curioso identificado em uma das unidades da Santa Casa. A Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON) atende pacientes oriundos de outros territórios, alguns mais desenvolvidos, outros menos.
No território Metropolitano de Salvador, por exemplo, cujo PIB per capta é 36,5% superior ao do Portal do Sertão, está localizado o município de Camaçari, lar de um dos pacientes da UNACON, o senhor José. O idoso de 70 anos buscou assistência primeiro no Hospital Aristides Maltez (HAM), referência em oncologia na capital do estado, após a descoberta de um nódulo cancerígeno. Visando retirar o câncer enquanto a intervenção cirúrgica ainda era possível, o senhor José optou por deixar o processo de triagem do HAM em prol do UNACON de Feira de Santana. “Graças a Deus não precisou [do tratamento quimioterápico]. O atendimento aqui é especial, ótimo mesmo”, disse o aposentado.
Um processo de migração semelhante pode ser observado no caso de um paciente residente do Recôncavo, ainda que por razões diferentes. Isso porque, ao contrário do Metropolitano de Salvador, o território de identidade do Recôncavo ainda é marcado por menor desenvolvimento socioeconômico. O PIB per capta do território é 41,57% menor do que o Portão do Sertão e faltam hospitais de referência. Foi o que levou o eletrotécnico, Antônio, de 42 anos, de Sapeaçu, a acompanhar um conhecido no tratamento oncológico. Sem opções em sua região, os dois recorreram ao HDPA, onde foram encaminhados ao UNACON. “A gente aprende muitas coisas, com a vida e com a situação. A gente tem que ter empatia, a pessoa passando uma situação dessa”, refletiu.
Atualmente, o UNACON recebe cerca de 180 pacientes diariamente para tratamento com quimio e radioterapia, uma média de três internações por dia e 40 por mês. De acordo com projeções do Instituto Nacional do Câncer (INCA), até 2025 o Brasil deverá registrar cerca de 704 mil novos casos da doença, enquanto em Feira de Santana, o Centro Municipal de Prevenção ao Câncer Romilda Maltez (CMPC) registrou mais de 1.000 novos casos no município desde 2018. Os números só aumentam desde 2021.
UNACON, unidade de tratamento oncológico do HDPA (créditos: Santa Casa de Misericórdia)
De acordo com o Ministério da Saúde, várias condições podem influenciar na ocorrência da doença, como fatores externos (meio ambiente, hábitos, costumes e qualidade de vida da pessoa) ou internos (geneticamente pré-determinados). A enfermeira Taiane Rocha Lima atua na coordenação do setor de quimioterapia da Santa Casa. Em menos de três anos na ocupação, a profissional afirma que os casos de câncer estão aumentando, principalmente entre pessoas jovens, homens e mulheres, entre 28 e 45 anos. “A gente entende que esse aumento no número de [casos de] câncer está relacionado ao acesso a exames e a maiores diagnósticos, mas também ao estilo de vida, alimentação, à questão do tabagismo e etilismo”, afirmou.
Junto ao câncer, os números crescentes de fatalidades de origem cardiovascular também devem ser levados em consideração. Ao nos debruçarmos sobre o aumento de diagnósticos nesses dois grupos de enfermidades, verificamos que tanto o câncer quanto as doenças cardiovasculares estão associados com o tabagismo, má alimentação e uso nocivo de álcool.
Sala de cirurgia para procedimentos cardiológicos (créditos: Santa Casa de Misericórdia)
Sobretudo, ambas doenças estão tendo uma alta de incidência entre os jovens, visto que todas as causas têm relação com aumento no nível de estresse dessa parcela da população. De acordo com dados do Instituto Nacional de Cardiologia (INC) e da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), desde 2008 a média mensal de internações por infarto subiu 10% entre jovens de até 30 anos, com um aumento vertiginoso, principalmente, em mulheres entre 15 a 49 anos, segmento que teve 62% de alta no número de mortes por essa razão no Brasil entre 1990 e 2019.
É possível que o volume de notícias ruins nacionais e internacionais, junto aos desafios dos cenários econômico, social e ambiental estejam aumentando o estresse a ponto de os jovens buscarem cada vez mais álcool, tabaco e alimentação rica em gorduras e ultraprocessados como válvulas de escape. A combinação levaria a um estilo de vida pouco saudável, o que explica os atuais números de câncer e infarto registrados. Hoje, 400 mil brasileiros morrem por ano em decorrência de doenças do coração e, segundo INC, num intervalo de 14 anos, o número de internações por infarto aumentou 157% no país.
A cardiologia é outra área em que a Santa Casa de Feira é referência. Desde a implementação do setor de hemodinâmica, o HCardio, já realizou mais de 16 mil procedimentos na área, incluindo cateterismo cardíaco, angioplastia e implante de marcapasso.
Em 2019, o vendedor Cesar Ribeiro Rabello, de 54 anos, foi acometido por um infarto agudo no miocárdio, tendo que ficar internado por duas semanas no HCardio. “Fui prontamente atendido e direcionado pela equipe médica para fazer cateterismo no mesmo dia, além de uma angioplastia”, afirmou. Quando questionado se o tratamento prestado foi satisfatório, Cesar concordou. “O atendimento foi eficaz. Hoje, tenho a mesma condição que tinha antes do infarto. Como sempre gostei da prática de esportes – corrida, academia, bicicleta e arte marcial -, continuo a fazer até com mais intensidade”, detalhou.

Recepção do HCardio, unidade de referência em cardiologia (créditos: Santa Casa de Misericórdia)
Assim como Feira de Santana é o maior entroncamento rodoviário do Norte e Nordeste, o HDPA também é o ponto de confluência de pessoas dos mais diversos municípios do entorno. A unidade de saúde supre o papel social de garantir atendimento nas mais diversas especialidades da saúde para pacientes de territórios mais economicamente privilegiados ou menos. A Santa Casa de Misericórdia tem noção dessa importância e está empenhada em garantir que as pautas mais importantes estejam em voga, promovendo eventos que misturam conscientização e exercícios físicos como complemento aos serviços prestados.
A Caminhada do Amor, realizada todo mês de novembro para ajudar nas campanhas de prevenção contra o câncer de mama e próstata, é um exemplo da relação do HDPA na comunidade de Feira de Santana. O evento contribui para captar recursos para o hospital e dar continuidade às ações da instituição, construída e mantida, em parte, por meio da caridade.