Outubro Rosa é momento de falar sobre a sexualidade feminina e como a valorização dela pode ajudar durante o tratamento contra o câncer de mama
Lis Tauany Oliveira
*Publicado em dezembro de 2022
A campanha contra o câncer de mama se intensifica no mês de outubro. Muitos assuntos e debates ganham destaque, como o autoexame e entre eles está a saúde mental e física dessas pacientes. Um tema que vem ganhando força com o passar dos anos e com a evolução da temática é a sexualidade. Durante o tratamento muitas pacientes ficam sensíveis, pois o processo afeta drasticamente a forma como as mulheres se enxergam e, consequentemente, sua autoestima.
Rita de Cassia dos Santos, 42 anos, por exemplo, passa por esta experiência. Há dois anos enfrentou o tratamento contra o câncer de mama, mas ainda faz acompanhamento na UNACON (Unidades de Alta Complexidade em Oncologia) localizado na sua cidade natal, Feira de Santana-BA. Ela passou por diversas dificuldades que tiveram como consequência a perda de autoestima:
“Eu não sinto vontade de sair e encontrar outras pessoas, tudo isso devido às mudanças no meu corpo. Eu perdi vontade de namorar e ainda tenho dificuldade de me olhar no espelho”, contou Rita de Cássia dos Santos.
Rita de Cássia Santos contou que ficou com baixa autoestima. Fonte: Acervo Pessoal.
A sexualidade feminina ainda é um tabu mesmo depois de tantas mudanças sociais, como o crescimento da figura da mulher em diversos aspectos. Ainda é reprimida pela sociedade e esse assunto é ainda mais questionado quando essas enfrentam algum tratamento de saúde, por exemplo, o câncer de mama, a doença que mais afeta as mulheres segundo pesquisa feita pela Sociedade Brasileira de Oncologia.
Mulheres que passaram ou estão passando pelo câncer de mama enfrentam muitas relutâncias quando o assunto é sexualidade durante e após o tratamento. As dificuldades vão desde físicas até as emocionais.
Dores físicas e emocionais
Com o tratamento de quimio, radioterapia e intervenções cirúrgicas surgem consequências físicas, como perda de cabelo, dor, secura vacinal, perda de libido e principalmente a mastectomia que atinge diretamente o maior símbolo da feminilidade (os seios). Tudo isso abala a autoestima e autoimagem das mulheres, criando uma insegurança com o próprio corpo e com a sua sexualidade, afetando assim o seu psicológico.
Uma pesquisa feita com 1.039 participantes entre julho e agosto de 2019 pela maior instituição de caridade contra o câncer de mama no Reino Unido, a Breast Cancer Now, afirma que quase metade das mulheres (46%) tiveram dificuldade sexuais como resultado do tratamento de câncer de mama e mesmo dentro desse recorte cerca de um terço (34%) precisavam de ajuda mas não pediram, muitas tinham vergonha de pedir por diversos motivos como: não querer fazer a equipe médica perder tempo, não achar necessário comentar sobre o assunto ou não saber a quem perguntar.
Rita revelou que a preocupação com a sexualidade durante sua luta contra o câncer foi logo quando recebeu o diagnóstico, a aflição com a vida amorosa se intensificou durante, mas tudo se deu com início da perda de cabelo e com a sua autoestima se esvaziando, as suas saídas de casa eram restritas a visitas ao médico.
Com a sua equipe médica ela dividia os seus sintomas e preocupações: “Falei com a minha médica que não sentia mais vontade de namorar e ela disse que é comum devido a quantidade de remédio que tomava. Chorava muito durante o acompanhamento com o psicólogo, mas deveria continuar indo porque até hoje não me sinto segura pra falar abertamente sobre isso”.
Essa pesquisa feita pela Breast Cancer Now e o relato de Rita de Cássia mostram a importância da conversa sobre esse tema entre os profissionais da saúde e seus pacientes. É importante que durante o tratamento as mulheres mantenham a sua feminilidade viva, muito porque com o avanço da tecnologia o câncer de mama possui uma taxa de cura em torno de 95% quando descoberto precocemente, isso faz com que a sexualidade seja um dos aspectos importantes na qualidade de vida durante o processo de cura e o pós.
O sexo saudável já foi considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como essencial para a melhora da qualidade de vida e um bem-estar físico, mental e social. Mesmo assim, no Brasil a sexualidade ainda não é usada durante a abordagem clínica desses tratamentos, mesmo com um número expressivo de pacientes que não desistem da sua vida sexual.
Essa relação foi comprovada por um estudo feito em 2012 pela Universidade de São Paulo (USP) com cerca de 139 pacientes com câncer de mama. Nessa pesquisa foi relevado que mais da metade das entrevistadas (56,8%) revelaram ter tido ao menos um parceiro sexual no último ano e 48,9% disseram ter feito sexo no último mês. Isso mostra que, ao contrário do que se possa achar, quase metade das mulheres que passam pelo tratamento de câncer de mama têm uma vida sexual ativa.
Benefícios da sexualidade
E sendo essencial manter qualidade de vida durante esse período tão difícil que é o tratamento do câncer de mama e tendo a sexualidade como um dos pilares para manutenção da saúde: Qual é o benefício que a sexualidade ativa traz para esses pacientes, principalmente durante o tratamento?
Sobre o período de acompanhamento de pacientes com CA de mama, a psicóloga Alany Oliveira destaca a importância do processo terapêutico para trabalhar sentimentos diversos e importantes diante do diagnóstico e tratamento do câncer, ele é vivido pela mulher e por pessoas à sua volta:
“Os sentimentos mais comuns apresentados em mulheres acometidas pelo câncer de mama são: raiva, tristeza, ansiedade, inquietação, angústia, medo e luto. Cada indivíduo interpreta a doença de uma forma pessoal e pode utilizar a negação como um perigoso mecanismo de defesa”, explicou a psicóloga Alany Oliveira.
Outro aspecto trazido por Alany Oliveira que mostra onde está o amparo que a discussão sobre sexualidade pode trazer aos pacientes que ela acompanha: “Essa discussão ajuda o paciente a adaptar o tratamento à sua vida, bem como adaptar as visões de si próprios a esta nova situação. Isso facilita a aderência ao tratamento, oferece suporte emocional frente ao diagnóstico.”
A psicóloga Alany Oliveira enfatizou a importância de desenvolver estratégias de enfrentamento das dificuldades emocionais das pacientes. Foto: Acervo pessoal.
“Também pode prevenir comportamentos de risco a saúde, efeitos colaterais que afeta a autoimagem da mulher, contribuindo assim para a aproximação social e afetiva, a verbalização das emoções ajuda a reorganizar os pensamentos, reconhecer os sentimentos e desenvolver estratégias de enfrentamento das dificuldades emocionais e sexuais relacionadas ao diagnóstico e tratamento do câncer de mama”, afirma a psicóloga.
O prazer faz com que a relação sexual traga felicidade, relaxamento, contribui para diminuição da ansiedade e traz maior interação com as parcerias que são de suma importância durante o caminho difícil do tratamento onde muitas passam por quimio, radioterapia ou até mesmo o processo cirúrgico como a mastectomia (retirada dos seios).
Com isso, nesse momento é válido lembrar a importância de valorizar a relação com o próprio corpo ou com o parceiro (a) e entender as coisas que realmente importam na vida nesse período difícil. E claro, é importante que as mulheres se sintam acolhidas, até para se manterem confiantes em busca da cura.
Ir contra tabus, orientar e ajudar pacientes pode ser um caminho para profissionais da saúde darem a devida atenção à vida sexual saudável durante o tratamento, entendendo que não existem regras ou manual e garantindo a felicidade de muitas mulheres que às vezes perdem esse momento devido à dificuldade que o câncer de mama traz.



