Conselheira quilombola: a trajetória de ativismo cultural de Pan Batista

Agente cultural atuante em Santiago do Iguape, Pan Batista chegou à presidência do Conselho de Cultura do Estado da Bahia como a primeira mulher de origem quilombola a ocupar esse posto.

por Shagaly Ferreira

Ascom CEC

O mês de junho se aproximava do fim, enquanto as festas de São Pedro começavam a tomar conta do povoado de Santiago do Iguape, em Cachoeira. Mais precisamente, no dia 27, uma de suas filhas ilustres deu à sua comunidade mais um motivo para comemorar além dos festejos juninos: Adinil Batista de Souza, conhecida popularmente como Pan Batista, se tornou a primeira mulher de origem quilombola a presidir o Conselho de Cultura do Estado da Bahia, coroando uma trajetória antiga de engajamento na área da cultura.

Naquela localidade, a agente cultural cresceu em meio a um contexto de vivência íntima com as manifestações culturais. Em sua família, havia artistas, músicos, rezadeiras; um grupo engajado com as festas da região. Assim, já desde os 12 anos, a caminhada de Pan como articuladora e mobilizadora cultural começou a se desenhar, com o objetivo de buscar o fortalecimento da cultura da comunidade quilombola, sempre exaltada em suas falas públicas.

“Morar em uma comunidade quilombola, para mim, que sou nascida e criada em Santiago, é estar enfrentando desafios relacionados à acessibilidade, ausência de alguns serviços, mas, ao mesmo tempo, ver que essas ausências ou carências de serviços e estrutura nos fortalecem e nos fazem exercitar as práticas coletivas e a valorização do outro, das riquezas naturais. Enfim, o Iguape, para mim, é meu chão, meu tesouro, meu início e meu fim”, afirmou a agente cultural, que é aluna do curso de Licenciatura em História da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, onde ingressou como cotista e foi uma das primeiras estudantes da instituição a ser contemplada com a bolsa permanência quilombola.

Projetos culturais

Ativa nas ações culturais de sua comunidade, Pan Batista, atualmente, é diretora artística da Associação Cultural e Artística de Santiago do Iguape (ACASI), além de coordenar o Receptivo Étnico Filhos de Engenhos, que recebe caravanas de turistas e estudantes. “Trabalhamos a formação musical dos jovens envolvidos, por meio da percussão. Um trabalho realizado em parceria com meu esposo, que é percussionista”, explicou.

Para ações futuras, a mobilizadora planeja a construção de uma rede de capoeiristas. “É um projeto e desejo antigo o uso da capoeira como ferramenta de inclusão social e cidadania. Um projeto de diálogo com grupos, capoeiristas e mestres de capoeira do Recôncavo, da capital e de fora do estado”, acrescentou Pan, que tem atuado também em ações de fortalecimento e empoderamento de mulheres na comunidade quilombola, nos espaços dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) Quilombolas de Santiago do Iguape, além de realizar a Feira Afro-cultural no Iguape, que, em 2019, terá sua nona edição.

Conselho de Cultura

Lucas Rosário Ascom Secult

O mais novo desafio de Pan Batista é o de presidir o Conselho Estadual de Cultura da Bahia (CEC), do qual faz parte desde 2018, ao lado de Junieques Santos, seu vice-presidente. O ingresso no Conselho se deu através de votação pública para a vaga de representação da sociedade civil em Segmentos Culturais e Processos do Fazer Cultural. “Quando começamos a caminhada, não imaginávamos o quanto acumularíamos experiências em diversos meios. Estou no segundo mandato no CEC. Eu aprendi e aprendo muito com meus colegas conselheiros e temos uma relação mútua de aprendizagem”, pontuou, acrescentando que, no processo de eleição, teve que enfrentar o preconceito de quem questionava sua capacidade de gestão por conta das suas origens.

“Ser hoje a primeira mulher negra de origem quilombola a ser presidente do Conselho Estadual de Cultura da Bahia é um presente, uma missão para com meu povo e tantas vozes nessa Bahia plural que nos cerca. E missão é algo que a gente não questiona. Eu amo cultura, amo ver um grupo ou um artista sendo valorizado. Ser quilombola, para mim, é motivo de orgulho. Nossa conquista foi coletiva, um grito da sociedade civil aliado aos nossos principais objetivos: a interiorização da cultura”, comemora Pan, que irá comandar Conselho até 2022.

Presença feminina no Conselho de Cultura do Estado da Bahia

Conforme informações da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, cerca de 30 mulheres integraram o Conselho, desde sua criação em 1967. Neste período, duas delas assumiram a presidência e outras duas a vice-presidência:

Eulâmpia Reiber (presidente 2005-2006);

Lia Robatto (presidente 2010-2011);

Myriam Fraga (vice-presidente por dois mandatos na década de 1990);

Ana Vaneska (vice-presidente entre 2017 e 2019).

Pan Batista será a terceira mulher a assumir a presidência em 5 décadas de existência do Conselho.

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