Feiras contribuem para a comercialização da agricultura familiar no Recôncavo

Espaços de exposição do território facilitam a relação direta entre produtores rurais, artesãos e consumidores.

Por Maria Alice Santos e Júnior Rodrigues*.

A agricultura familiar é responsável pela produção da maior parte dos alimentos consumidos pelos brasileiros. Na Bahia, estudos mostram que durante a década passada as atividades agropecuárias realizadas por núcleos familiares representavam quase metade da economia produzida por todo o setor. No entanto, a comercialização dos produtos ainda apresenta desafios para parte significativa das trabalhadoras e trabalhadores do campo.

Além da exposição nas feiras livres locais, a produção da agricultura familiar busca novos espaços para qualificar as vendas e gerar renda. A organização de feiras agroecológicas em todo Estado é exemplo disso. Da mesma forma, a criação de espaços de comercialização, em Salvador, dedicados à oferta da produção sustentável realizada por trabalhadores vinculados aos movimentos sociais dedicados à luta pela terra.

No Recôncavo Baiano, um mapa interativo organizado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), registra pelo menos três espaços regulares de comercialização de produtos orgânicos no território. No entanto, outras iniciativas contribuem para facilitar o acesso do consumidor à produção rural tradicional. A Feira da Agricultura Familiar e Economia Solidária realizada quinzenalmente no campus de Cruz das Almas, da Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), é um exemplo.

Também é possível verificar nas feiras destinadas à exposição de produtos e serviços para o agronegócio espaços dedicados à comercialização de produtos da agricultura familiar e economia solidária. Um dos eventos realizados no território, a ExpoCruz, ocorrida em setembro deste ano, atraiu produtores e comerciantes do Recôncavo Baiano.

Uma das expositoras da feira e moradora da comunidade rural da Gurunga, em Cruz das Almas, Dona Valdete, organizou o espaço no qual expôs a própria produção. Entre as variedades, comercializou milho, laranja, aipim, maracujá e feijão. A agricultora conta com a ajuda do filho para realizar as atividades da roça e a comercialização na feira livre da cidade.

Dona Valdete assumiu a produção rural da propriedade há três anos. A jornada começou como uma busca por renda extra para a família, mas se transformou em algo muito mais significativo. “Eu comecei com pouquinho e a cada ano vai aumentando”, afirmou.

Dona Valdete vendendo seus produtos durante a ExpoCruz 2023. Foto: Maria Alice Santos

A trabalhadora também é beneficiária de políticas públicas destinadas a contribuir com a melhoria da vida das mulheres no campo. “Eu faço parte desse projeto da agricultura familiar. Eu vendo meus produtos para a prefeitura. É muito bom”, disse Dona Valdete.

Movimento – De acordo com o poder público municipal, a ExpoCruz, movimentou cerca de R$3 milhões em negócios, em 2023. Estima-se a geração de 1.500 empregos temporários durante o evento. A feira, que até antes da pandemia da covid-19, dedicava-se, em especial, à exposição de flores, também oferece áreas para a comercialização de artesanato, entre outros produtos. 

A artesã Maria Augusta foi uma das expositoras do evento. A trabalhadora contou que a paixão pela arte vem desde a infância e foi transmitida pela mãe, que fazia produtos utilizando retalhos de tecidos. Durante o período de pandemia da covid-19, a artesã passou a dedicar-se à produção das próprias peças. “Eu trabalho muito com pano de prato, gosto muito de coisas de cozinha”.

Dona Maria Augusta e o artesanato que produz. Foto: Maria Alice Santos

Questionada sobre as dificuldades de comercializar o artesanato, Maria Augusta enfatizou a importância de não desistir. “Tem dias que é muito difícil, mas se a gente se entregar não vai pra canto nenhum. Tem que tropeçar, cair e levantar”, recomendou.

Criação – Em meio aos expositores da Expocruz dedicados à criação de animais, o dentista Tacílio Santana chamava a atenção. O morador de Cruz das Almas expôs uma criação própria a qual intitulou “poleiro urbano”. O equipamento é dedicado ao cuidado e alimentação de animais silvestres no espaço urbano, a exemplo de parques e praças.

De acordo com o idealizador, a invenção seria uma forma de permitir às pessoas admirar os pássaros sem depender do uso de armadilhas e gaiolas. “É um trabalho que tem toda preocupação biológica e ecológica. Não se pode usar qualquer produto químico, porque poderia prejudicar as aves”, afirmou. O criador destaca ainda a função do poleiro urbano contribuir com a educação ambiental de crianças e jovens, além de estimular o diálogo relacionado à relação entre humanos e a natureza.

Tacílio Santana defende a importância do poleiro urbano. Foto: Junior Rodrigues

Economia – Durante a abertura da Expocruz deste ano o prefeito de Cruz das Almas ressaltou a importância de eventos do tipo. “É um evento que gera renda, movimenta a economia do município e potencializa o trabalho dos empreendedores”, destacou.

A ExpoCruz movimenta o centro de Cruz das Almas com grandes variedades de produtos. Foto: Ascom/Cruz das Almas

Ainda de acordo com o gestor, a feira mobiliza centenas de expositores e estimula o desenvolvimento dos empreendimentos. O evento também fortalece a agricultura familiar e gera emprego no município. “É um espaço de trocas e aprendizados que a cada ano tem crescido”, ressaltou.

De acordo com a assessoria de comunicação de Cruz das Almas, a agricultura é uma das principais atividades econômicas da cidade. Destacam-se a produção de fumo, laranja, limão e mandioca. A agricultura familiar do município é beneficiária de programas públicos de estímulo à produção e comercialização de alimentos, a exemplo do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

Por meio do programa federal, a prefeitura municipal compra produtos a preço de prateleira diretamente da agricultura familiar do município. Isso incentiva os agricultores a produzirem mais e comercializarem um volume regular de alimentos, o que contribui com a renda familiar em diversas comunidades.

Em 2023, o programa destinou mais de R$800 mil para a compra de frutas, verduras, legumes e hortaliças de produtores do município. Os alimentos foram entregues para as famílias carentes cadastradas pela secretaria do Trabalho e Assistência Social e também para as famílias que possuem alunos matriculados nas creches.

Dados – De acordo com informações do último Censo Agropecuário 2017, produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a agricultura familiar produz cerca de 70% dos alimentos consumidos no país. Dados da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) do Estado mostram que em 2018, a agricultura familiar baiana movimentou cerca de R$6,1 bilhões. O resultado foi o segundo melhor da série histórica entre 2010 e 2018 e corresponde a 32% do valor adicionado do setor agropecuário no Estado.

A importância da atividade para a economia baiana é uma das justificativas para a realização da 14ª Feira Baiana da Agricultura Familiar e Economia Solidária, que será realizada entre os dias 13 e 17/12, em Salvador. As inscrições para participar da feira estão abertas até dia 16/11 e acontecem por meio dos sites da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR) e da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR).

*Editado por Vinicius Morende

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