Daniel foi +1

Esta é uma crônica escrita na emergência… não em cima da hora, e sim na emergência!

Danielle Almeida

Santo Antônio de Jesus, o comércio mais barato da Bahia, o melhor São João da Bahia, títulos que a cidade carrega com muito orgulho. Hoje, 18 de julho de 2022, uma segunda-feira, Saj (como o município é chamado) foi notícia no Fantástico e na Folha de São Paulo. O que aconteceu?  

Na manhã da sexta-feira (15), checando as notícias diárias, abro o um blog da minha cidade, afinal sou santoantoniense, e mais uma vez vejo uma corriqueira manchete, “Jovem morto a tiros pela Polícia Militar durante confronto”. Ignoro totalmente o fato e sigo meu dia. Sim, aqui na cidade isto é comum, experimente colocar na barra de pesquisa do Google: “Jovem morto em Santo Antônio de Jesus pela polícia”.

Passadas algumas horas me deparo como a mesma notícia, mas desta vez temos uma manchete diferente que não havia como ignorar. As câmeras de circuitos de segurança da vizinhança flagraram a ação e o jovem Daniel da Cruz de Jesus, morto pela PM , não havia recebido os policiais a tiros. Ele foi abordado e executado, as imagens captadas pelas câmeras contradizem toda a versão dada pela polícia. No vídeo é possível ver os policiais chegando em um carro descaracterizado, ou seja, sem a marca de instituição, abordando o jovem que ajoelhado, sem nenhuma reação ou resistência é EXECUTADO. 

Daniel tinha 24 anos. Havia saído de casa para levar seu passarinho para tomar sol. Foi morto no bairro Irmã Dulce, o Mutum. Não é um bairro nobre da cidade, mas isso eu nem precisava falar, pois, ao pesquisar no Google, você vai notar que essas mortes dos jovens de Saj  tem cor e uma localização específica, de jovens negros e dos bairros mais periféricos da cidade . 

No comércio mais barato da Bahia a carne mais barata do mercado é a negra. Os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) publicados em 2020, apontam Santo Antônio de Jesus como a cidade em que mais pessoas negras morrem em ações policiais no Brasil.  

 Neste momento surgem perguntas sobre o histórico de Daniel: “Ah, mas ninguém morre de graça”, “entrou nessa vida porque quis”, quem nunca ouviu isso? Mas não estou aqui para questionar a trajetória do jovem, e sim qual a função da PM? 

Em uma breve pesquisa na internet a reposta é simples: “Proteger o cidadão, sociedade e os bens públicos e privados, coibindo os ilícitos penais e as infrações administrativas”. Há outros questionamentos que sou levada a fazer: Para qual lado da sociedade essa proteção é bem-vinda? Pra quem vale essa “proteção”? 

São casos como esse de Daniel que só ganham uma nova versão graças às redes sociais e à circulação do vídeo. A notícia circulou o país inteiro e abre espaço para debates sobre a violência policial.

O discurso de “bandido bom é bandido morto” inflamado pelo atual Presidente da República dá o aval para que atitudes como essa ainda sejam aplaudidas e vistas como proteção e normalizem que corpos de jovens negros estejam sempre no alvo e no chão, sem nem precisar dar uma melhor explicação.