Fumeiro de Maragojipe ganha destaque no programa Mestre do Sabor

Fabricado artesanalmente, produtores maragojipanos mantém a tradição do moquém e buscam formalizar a atividade no mercado

Isabel Baião

Fumeiro exposto no moquém, no local de defumação, conhecido como giral (Foto: Isabel Baião)

A carne de fumeiro é uma iguaria típica do Recôncavo Baiano, especificamente do município de Maragogipe, cidade situada a 142 km da capital Salvador, que chama a atenção de quem a degusta pelo sabor e textura peculiares e pelo modo de produção 100% artesanal, conservando métodos e conhecimentos tradicionais passados há gerações. Bastante consumida na região, o fumeiro ganhou notoriedade e despertou a curiosidade dos chefs e jurados do reality show de culinária de umas das maiores emissoras de televisão brasileira, o programa Mestre do Sabor, na estreia de sua terceira temporada.

O prato ravióli de vatapá, com caldo de lambreta, fumeiro e farofa de licuri, apresentado pelo chef Cadu Moura na primeira etapa, garantiu sua vaga na competição gastronômica, em exibição no último dia 6 de maio deste ano. Os ingredientes utilizados representaram o Nordeste, a Bahia, e entre eles, a cidade baiana conhecida como sendo “a capital da carne de fumeiro” e outros defumados.

Vídeo da apresentação do prato com carne de fumeiro feita pelo chef Cadu Moura no Mestre do Sabor: https://globoplay.globo.com/v/9495413/

Prato contendo fumeiro de Maragogipe apresentado por Cadu Moura no reality show Mestre do Sabor. Foto: TV Globo/Imagem da internet

Produção

A forma de preparo do fumeiro é caracterizada na região pela tradição exclusiva do “moquém”- defumação a lenha. Esta técnica de defumagem das carnes é antiga, originária do período pré-histórico, e tinha o objetivo de conservar e aumentar o tempo de durabilidade dos alimentos. Com o passar do tempo, começou a ser amplamente utilizada porque se percebeu que este método proporcionava aromas e sabores peculiares aos produtos defumados.

Este tipo de atividade artesanal começou nos quintais e fazendas dos próprios produtores maragogipanos e foi preservada até hoje. Segundo dados da Secretaria Estadual da Agricultura (Seagri), o município possui aproximadamente 500 pessoas envolvidas ativamente neste tipo de produção como uma fonte de renda, sendo em torno de 23 produtores. A estimativa de produção é de 20 a 30 toneladas ao mês.

Os moradores da localidade consomem o fumeiro e outros defumados, como a chouriça, em diversos pratos e receitas culinárias. Na feijoada, no churrasco, ou até mesmo na moqueca. A carne defumada gera renda, movimenta a economia do local, além de ser referência em qualidade para outros países. Pode ser encontrada nos estabelecimentos comerciais do local, nas feiras livres da região e nas Ceasas (Centrais Estaduais de Abastecimento).

A fumaça proveniente da queima da madeira é a responsável por introduzir o sabor característico da carne defumada (Foto: Isabel Baião)

Processo

O procedimento artesanal consiste na exposição do produto em moquéns – grelha de madeira – a temperaturas e a fumaça proveniente da queima lenta da lenha, realizada nas chamadas câmaras de combustão, denominadas na região como girais. A matéria-prima é o porco da espécie do landrasto, um suíno de pelagem branca. Conhecidos como produtores de fumeiro, eles cuidam de cada fase, desde o abate e da seleção dos cortes, do tempero e da defumação das peças, até o momento de sua comercialização.

Valtemírio dos Santos, 56 anos, conhecido popularmente como Miro, é produtor de fumeiro e trabalha com defumados a mais de 30 anos. Com este ofício conseguiu ter a casa própria e sustentar seus dois filhos. De acordo com sua experiência, o segredo de uma boa carne defumada está no tempero e, é claro, em saber trabalhar. Os ingredientes são bem simples e acessíveis no mercado. O tempero das carnes leva apenas alho, sal e cuminho, enquanto que o fumeiro contém apenas sal.

Como diz o ditado popular, a pressa é a inimiga da perfeição do fumeiro. É um processo vagaroso que pode levar horas. Há quem prefira fazer a defumação no mesmo dia. Mais também á aqueles que optam pela defumação no dia seguinte, para deixar a carne temperar ou salgar por um bom tempo.

“Eu a deixo dormir no tempero por 24 horas para ficar mais saborosa e salgar toda. Depois, lavamos por duas ou três vezes, colocamos para escorrer e no dia seguinte a gente começa o procedimento de defumar para retirar a carne bem defumada, a carne de primeira”, destacou Valtemírio.

Regulamentação

Apesar de possuir um grande potencial econômico e ser uma atividade comum na cidade, os produtores enfrentam algumas dificuldades em relação à distribuição de seus produtos diretamente nas redes comerciais, em grande escala. Por não conseguir atender a alguns requisitos e normas fiscais exigidos para as mercadorias e pela falta de infraestrutura para a produção.

Os problemas enfrentados pelos produtores vão desde perseguições a apreensão de suas mercadorias, resultando em prejuízos para os produtores. Muitos deles sobrevivem e se mantêm por meio dos defumados. Para reverter esta situação, os produtores se uniram e criaram a Associação dos Produtores de Carne de Fumeiro de Maragogipe, em funcionamento há quatro anos como uma cooperativa, articulando estratégias junto com o governo estadual e o municipal para continuar, formalizar de vez a produção e manter viva a tradição.

“O objetivo da associação é a gente se legalizar e trabalhar em conjunto. Desta forma, sabemos que iremos ganhar muito. Nós já temos o mercado e podemos ampliá-lo ainda mais”, relatou a produtora e presidenta da associação, Simone Santos.  Com a construção da Casa do Fumeiro, em andamento, localizada no limite da estrada de Santo Antônio de Aldeia, no município, os produtores poderão trabalhar de maneira totalmente formal.

De acordo com a presidenta da cooperativa, há a possibilidade de expansão dos produtos no mercado nacional e internacional de forma mais prática, sem as dificuldades fiscais, e sem perder a característica artesanal da tradição do moquém e além do mais, investir na capacitação dos produtores. “Com certeza! Vamos trabalhar em grande escala e poder colocar em grandes mercados. Nós vamos poder produzir mais, empregar mais e a nossa renda ficar maior na cidade. Vai mexer com toda a economia do município, mais do que já mexe”, concluiu Simone.

 

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