Mulheres negras nos espaços acadêmicos: Sim, elas existem!

Nos últimos anos, o número de universidades públicas no Brasil tem crescido pertinentemente. O ingresso de jovens negros e indígenas tem sido possível devido a implantação das políticas públicas que buscam assegurar a inclusão racial nesses espaços que, até então, foram ocupados durante décadas exclusivamente por indivíduos brancos.

Ainda assim, hoje é possível notar a presença dominante de mulheres nas academias, comparada a participação masculina. No entanto, em termos de raça, a dominância feminina nas universidades não contempla os 25% de mulheres negras que compõem a população brasileira, o que nos leva a questionar: Onde estão essas mulheres?

Num texto publicado em 2010 pela editora Perspectiva, titulado Doutoras professoras negras: o que nos dizem os indicadores oficiais, Joselina da Silva analisa através de dados, a ascensão das mulheres negras doutoras e universitárias. Em sua análise, ela percebe que estas mulheres ainda são minorias e enfatiza a necessidade da inclusão das políticas de cotas raciais agregada às de gênero, para mudar este cenário.

Deslocando essa realidade para o Recôncavo e colhendo dados para esta matéria, entrevistei duas mulheres negras. A Laila Castro, 20, estudante do último ano do ensino médio. E Laíla Maíse Santos, 20, estudante do 1º semestre de Letras.

Sobre as perspectivas em seguir carreira acadêmica, Laila acentua seu interesse em cursar jornalismo e reconhece as dificuldades enfrentadas pelas mulheres negras, provenientes de escolas públicas, cujo o ensino ainda é deficiente. Ela disse que desde então, já tem se deparado com o preconceito racial e de gênero, principalmente no mercado de trabalho. Seu primeiro contato com a discriminação foi quando, ao colocar currículo numa empresa da cidade, sentiu o quanto a cor da sua pele e seu cabelo crespo incomodavam e eram negados.

Já Laíla Maíse apontou as dificuldades enfrentadas enquanto cursava jornalismo (curso que fazia antes de ingressar em Letras). Ela relatou o medo de encarar a disciplina de Telejornalismo, devido os estereótipos reforçados em falas de alguns professores do curso. “A ideia de que mulher negra e de cabelo crespo não serve como âncora de telejornais, foi um dos motivos do meu desencanto com o curso” disse.

 

LailaLaila Castro é cachoeirana, filha e neta de mulheres negras

Ao falar sobre a necessidade das mulheres negras ocuparem os espaços, majoritariamente preenchidos por brancos, Laila expressou sua indignação com o racismo e sexismo, e ressaltou que está disposta a enfrentar todos os fatores discriminatórios, influenciando outras mulheres negras a lutarem pelos seus lugares de fala.  Laíla Maíse acredita que as mulheres negras precisam cada vez mais ocupar os espaços, e a luta pelo doutorado é fundamental para que elas consigam assumir um lugar que vem sendo conquistado, em maior número, por mulheres brancas.

Um outro ponto importante, é a ausência de professoras negras nos cursos universitários que tem sido um grande problema enfrentado nas universidades.

Utilizando como exemplo a relação do corpo docente do curso de Comunicação Social/Jornalismo, do Centro de Artes, Humanidades e Letras – neste caso reconhecido como o Centro mais negro da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) –, baseado na cor da pele e não na auto declaração, podemos perceber, nitidamente, a ausência de mulheres negras e, por conseguinte, da representatividade nesse cargo.

Gráfico 1. Docentes por sexo

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Segundo a relação disponível no site (www.ufrb.edu), o colegiado de jornalismo é composto por 16 professores e as mulheres brancas são maioria. No entanto, no semestre 2015.2 foi ofertada ao curso uma disciplina de caráter optativo que trata de questões raciais na mídia, ministrada por duas mulheres negras. Considerando a inclusão de duas mulheres negras ao quadro de professoras (mesmo que não pertencentes ao colegiado do curso), pensa-se um novo gráfico.

Gráfico 2. Docentes femininas por raça/cor

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O gráfico acima mascara a singularidade da presença de mulheres professoras negras em cursos universitários –  mesmo num curso pertencente ao Centro tido como o mais negro da UFRB. Isso se deve a pirâmide racial onde “o gênero e raça são marcadores determinantes para resultados desiguais na obtenção de status”, afirma Joselina da Silva. Logo, a mulher negra que ocupa a posição mais inferior da pirâmide, é quem mais sofre com a ascensão social. Isto acentua a necessidade de se pensar cotas para gênero.

Desse modo, é preciso pensar a inclusão das mulheres negras no doutorado e nas universidades como uma forma de quebrar, mesmo que aos poucos, os elementos que as distanciam do direito de ocupar esses espaços.  É preciso pensar a mulher negra não como representante das academias e/ou da burguesia, mas como um espelho para muitas outras mulheres que precisarão se sentir contempladas só por acreditar que se uma conseguiu chegar, elas conseguirão também. Esta é uma luta árdua contra o racismo e sexismo que insiste em nos apagar. E para ajudar nesta luta, representatividade é tudo.

REFERÊNCIA CITADA

DA SILVA, Joselina. Doutoras professoras negras: o que nos dizem os indicadores oficiais. Florianópolis: Perspectiva, 2010.

 

Luana Souza

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