Professoras doutoras negras: um caso de sucesso e representatividade no Recôncavo

Por: Jamile Novaes

Segundo indicadores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) e Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), até o ano de 2005, dos 63.234 docentes do ensino superior, 1.659 eram mulheres negras e, dentre essas, apenas 251(0,4%) possuíam o título de doutorado. Tais dados retratam uma limitação existente no acesso de mulheres negras à universidade. Mesmo entre as que ingressam no ensino superior ainda são poucas as que atingem a ascensão e êxito acadêmicos, pois há dificuldades também no que diz respeito à permanência dessas mulheres na universidade.

Para as mulheres, no geral, a universidade ainda se dá como um desafio. Em primeiro momento, foram impedidas pela sociedade hegemonicamente patriarcal de ter acesso a esse espaço e, quando enfim conquistam esse direito, as dificuldades se dão no sentido de conciliar a vida acadêmica com as tarefas do lar(cuidados com marido, filhos, etc.).

Para as mulheres negras, especificamente, além da jornada dupla, como acadêmicas e donas de casa, em muitos casos se faz presente também a questão de classe social. Ao longo da história – afetada pela escravidão – essas mulheres tiverama sua ascensão social e econômica comprometidas. As discriminações raciais e de gênero, atuando em conjunto, delimitaram espaços(inclusive físicos) e delegaram a elas os papéis de subalternidade financeira e profissional.

Professora Doutora Rita Dias.
Professora Doutora Rita Dias.

A Professora Doutora Rita de Cássia Dias, mulher negra nascida em Cachoeira, concluiu o Doutorado em Educação na Universidade Federal da Bahia (UFBA) no ano de 2007. Atualmente é professora adjunta I da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias – Cecult-UFRB e tutora do PET (Programa de Educação Tutorial) Conexões de Saberes: Acesso, Permanência e Pós-permanência.

O grupo tutorado pela profª Rita estuda políticas  institucionais de inclusão e permanência de estudantes pertencentes a grupos social e economicamente menos favorecidos e de origem popular na universidade e faz reflexões sobre o currículo de formação acadêmica, levando em conta as especificidades e vivências desses estudantes. Apesar de não ser exclusivamente feminino, o grupo atualmente é composto em grande parte por estudantes negras que tem a oportunidade de pensar e desenvolver ações voltadas especificamente para o seu grupo de pertencimento.

Yasmin Gonçalves, negra, graduada em História pela UFRB e ex-integrante do grupo PET, ao ser perguntada sobre a sua experiência no programa, diz: “O PET Acesso, Permanência e Pós-permanência na UFRB é um programa que se  propõe dentro da estrutura do PET uma ‘parada’ diferenciada porque tem o seu foco para estudantes cotistas, pra estudantes de escola pública, em sua maioria negros que dialogam com toda essa identidade de origem popular e identidade de origem racial também. Isso me agradou muito por eu estar dentro de um espaço no qual eu me encontrava com os meus, que vem desde a estrutura da tutoria até a forma como os meus colegas se desenvolveram no programa.”

Rita, Yasmin e amigos em sua cerimônia de colação de grau.
Rita, Yasmin e amigos em sua cerimônia de colação de grau.

Quanto à representatividade da professora Rita enquanto tutora do programa, Yasmin afirma que a identificação de gênero e, principalmente, racial, se deu como um ponto crucial tanto na sua permanência no PET, quanto na universidade: “A professora Rita, com a sua forma de fazer ciência, a sua forma de ser educadora, estabelece uma metodologia diferenciada das outras professoras e dos outros professores. A figura e a tutoria tem que ser pensada também em cada grupo, trazendo essas identidades nas quais as pessoas que participam do programa irão se identificar, irão dialogar. Ela é cachoeirana, eu também sou cachoeirana. Ela tem uma relação pessoal com esse território do Recôncavo, assim como eu e a maioria dos colegas que participavam e participam do programa.”

A partir dessa experiência é possível refletir sobre como a inclusão, ascensão acadêmica e a ocupação dos espaços de pesquisa  por mulheres negras, são fatores decisivos de transformação não apenas para essas mulheres individualmente, mas também para o coletivo que se vê representado nesses espaços.

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