O desaparecimento das benzedeiras do Recôncavo

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foto: Jorge Scritori

O benzimento é feito com galhos de guiné, alecrim e arruda, sendo que o ramo deve ter sete galhos, que são colhidos pelas benzedeiras. O benzimento é feito de acordo com o mal atribuído, como por exemplo, se o mal for olhado, a pessoa se senta diante da benzedeira e ela realiza as orações, fazendo o sinal da cruz com o ramo de ervas sobre a cabeça do doente. Nas rezas são utilizados vários tipos de orações da Igreja Católica, misturadas a palavras resmungos   incompreensíveis de um latim corrompido. Essas rezas atendem a diversos tipos de necessidades, além de buscar soluções para  conflitos familiares,  do corpo e da alma.

No final do século XIX e início do séc. XX era muito grande a procura das rezadeiras/ benzedeiras na região do Recôncavo para tratar de algum mal como olho gordo, gripe  e passagem de vento.

O trabalho de uma benzedeira envolvia toda uma preparação, dede a colheita das folhas e raízes até o ritual das rezas e orações, mas acreditava-se que  não bastava apenas conhecer  as folhas e raízes; era  preciso ter fé  pra quebrar o as forças negativas  tanto do doente quanto das rezadeiras para que os banhos e orações fizesse efeito.

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A0EAHB Medicinal herbs: google imagens

As práticas de curas através do uso de folhas, plantas, raízes e cascas faziam parte do Recôncavo, e as receitas de banhos e chás eram socializadas entre as pessoas. O conhecimento das benzedeiras era transmitido de geração para geração, fazendo parte da tradição e memória da nossa região.

A preparação dos banhos eram momentos sagrados que exigiam concentração de quem os preparava, e a depender dos males que seriam curados, os banhos tinham horário para ser tomados. Em alguns casos os banhos eram tomados momentos antes do pôr-do-sol, outros poderiam ser tomados a noite, contanto que fosse antes da meia-noite, e outros  não tinham horários específicos para serem tomados. Além disso, esses banhos não contavam com nenhum outro elemento como sabonetes. Algumas plantas tinham horários para ser colhidas.

Sendo assim, pessoas que estavam com algum tipo de doença procuravam o tratamento alternativo que geralmente era realizado em casa. Folhas, ervas, chás, beberagens e raízes e uma boa reza eram os principais métodos utilizados pelas benzedeiras e rezadeiras para curar as mazelas da população.

Era notória a presença das rezadeiras nos quatro cantos da região do Recôncavo Baiano. As rezadeiras cuidavam pessoas com males do corpo e do espírito. Respeitadas por uns, rejeitadas por outros, tinham uma grande influência na nossa região, apesar de contrariar a medicina  moderna  e a igreja católica, por ter rituais que nos remete ao candomblé.

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foto: Fredox Carvalho

Donas de um conhecimento simbólico, mítico e mágico, elas habitavam e participavam de uma sociedade, esses saberes adquiridos são  transmitidos e reconstruídos, pelos povos indígenas, através da sua figura maior. O pajé transmitia seus ensinamentos para a figura que assumiria seu lugar, caso ele morresse. Esse conhecimento era passado de geração para geração. Para ser uma benzedeira é preciso que a pessoa tenha um dom.

Nos dias atuais, o que existe é uma certa de dificuldade em encontrar pessoas que realizem esse ritual, se é que assim pode-se chamar. O que houve foi uma perda da tradição cultural da região, o conhecimento que era transmitido hereditariamente se perdeu no caminho. As pessoas perderam o interesse pelo benzimento e a procura pelas rezadeiras também caiu. As benzedeiras que exerciam esse tipo de ritual atingiram uma idade avançada, desenvolveram doenças, ou mudaram de religião.

Outro fator que tem causado a  ausência das benzedeiras é a  falta de quem queira continuar com esses rituais, sendo assim as benzedeiras, mas experientes não tem para quem transmitir seus conhecimentos. Além disso, a medicina tradicional tem conseguido evoluir tecnologicamente, tornando-se eficaz no descobrimento de métodos de cura, ajudando na prevenção e nas descobertas de novas doenças e conquistando as pessoas.

As religiões mais tradicionais cristãs tem proibido a prática do benzimento, alegando  que esse ritual tem características espíritas  com origem no candomblé, religião africana.

Vigília Gomes, chamada carinhosamente de Vózinha, devido a sua idade, era uma benzedeira de mão cheia na cidade de Governador Mangabeira na região do Recôncavo da Bahia. Jadeilson Gomes, seu neto, nos revelou detalhes da sua convivência, ritual, preparação e o porquê que Dona vigília deixou de exercer a sua função?

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fotos: arquivo pessoal

Sobre a  CONVIVÊNCIA Jadeilson destacou: sempre foi tranquila, se tratando de reza sempre quando a gente chegava ela estava rezando, ou chegava alguém para rezar e também a necessidade que tínhamos de ser rezados, então de certa forma  a gente tinha  esse contato com algumas rezas que ela fazia, tipo olhado, passagem do vento, espinhela caída e cobreiro, víamos como uma forma bacana de servir as pessoas, tinha também a questão da cultura, não deixava de ser preservação da cultura, achávamos interessante até pela idade dela lembrar tantas orações, que para cada reza tinha um tipo de oração.

RITUAL: Acompanhava desde cortar as ervas, mas quando era a gente que ela iria rezar de olhado, que aas vezes a estava ali no quintal mesmo: vassourinha, pião, acompanhava desde o primeiro passo. Alguns casos quando chegava lá acompanhávamos. Quando ia rezar de olhado que era mais fácil, porque as ervas tinham ali na frente também acompanhávamos desde o início. Passagem também era com folhas que tinham no quintal. Espinhela nem precisava de folhas era pedras e orações. Alguns processos desses acompanhávamos sim, desde o início até a ultima frase da oração os pedidos.

PROCESSO DE PREPARAÇÃO: Não tinha processo de preparação porque as orações que ela fazia eram populares e bem simples, todas as rezas que ela fazia dependia apenas da folha, a erva no caso. Só cobreiro que ela precisava de água com sal, além da folha e depois no final da reza tinha que cortar as folhas e jogar nas cinzas, então preparação que se tinha era essa, mas ela particularmente parar em algum momento para se preparar não. Se fosse espinhela caída e a pessoa chegasse agora para rezar não podia, tinha que ser em jejum, ai ela dizia oh vem amanhã de manhã entre 6:30 e 7:00, mas não tinha nenhum aspecto no sentido de parar e preservar.

PARADA: Além da idade veio os problemas de saúde, ela ficou muito debilitada muito fraca. E as pessoas que se expõe a rezar deveria está bem, para  não adquirir nenhuma carga negativa, isso a gente ouvia muito de pessoas mais velhas. Outro fator foi a mudança de religião, mas aí ela praticamente já não rezava mais, ela era já era proibida de rezar devido ao seu problema de saúde.

 

Oração de Benzer de quebrante

Todas às vezes que for benzer alguém iniciar com as orações do Pai Nosso e Ave Maria.

À Nossa Mãe Maria Santíssima e a Nossa Mãe Maria Virgem pelas cinco chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo. Deus te fez, Deus te criou, Deus te batizou, Deus te crismou e Deus te consagrou. Deus te salve cruz bendita, lá no céu ta escrita (3x). Deus te salve casa santa lá no céu foi escrita (3x). Deus e a Jesus que cure seus filhos e suas filhas (nome da pessoa) Quero que Deus dá o poder de curar o mal ruim que está em (nome da pessoa) Ar da noite, ar do dia, ar das estrelas, ar da lua, ar do sol, ar do dia, ar do tempo, ar das águas, ares preto, ares branco, ares amarelo. Benzo (nome da pessoa) de quebrante, mal olhado e vento virado. Com dois eu lhe pus, com três eu lhe tiro, quando Deus pai, Deus Filho, Deus espírito Santo. Amém. Nossa Senhora saiu para o mundo curando três mal, curando de feitiço, malefício, inveja, invição e olho ruim. Com dois eu lhe pus, com três eu lhe tiro, com Deus Pai, Deus Filho, para sempre e Amém. Jesus. (Nome da pessoa) Em redor de _____________________ tem três conquista: São Pedro, São Paulo, São João Batista que defende do veneno, do feitiço, malefício, inveja, invição e olho ruim. Com Deus eu lhe pus, com três eu lhe tiro, com Deus Pai, Deus Filho para sempre e Amém Jesus.(3x)

Conheçam as principais folhas que eram bastante utilizadas pelas benzedeiras:

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*As fotos das ervas foram feitas no quintal da repórter : Vânia de Alcântara.

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